A primeira grande aventura

Não consigo precisar quanto tempo ou qual o tamanho do esforço demandado na criação do Aventuras na Selva, para micros compatíveis com o ZX81. Houve muita coisa envolvida no processo, sendo a principal delas o meu próprio aprendizado de programação. Mas tenho certeza de que não foi menor do que seis meses de trabalho nas horas vagas, madrugadas, fins de semana, etc. Uma típica produção Indie das antigas.


Aventuras na Selva

No início de 83 tanto o jogo quanto o modelo de produto que eu havia imaginado estava pronto. Tinha chegado até onde imaginei que era minha obrigação, ou seja, ao ponto de dizer: aqui está o jogo como produto. Agora é preciso produzi-lo. Na verdade eram dois produtos distintos: o Aventuras na Selva e o Aeroporto. Ambos jogos e ambos projetados para venda em banca. Um escrito em Basic e o outro totalmente em Assembler.

Não passava pela minha cabeça ser eu mesmo o produtor. Para falar a verdade, nem saberia por onde começar e me via apenas como uma espécie de escritor que além de escrever o livro, ilustrou e diagramou a capa e todo o resto. Agora competia às editoras imprimir os exemplares e distribuir para as lojas. Mas em 1983 nada disso existia para jogos em computador ou pelo menos existia um tímido início de mercado produtor.

Foi então que apareceu a oportunidade de publicar o jogo na revista Micro Sistemas. O modelo de publicação de programas (em livros e revistas) era o mais desenvolvido naquela época e a editora preferiu apenas publicá-los e não produzir um produto independente ou mesmo atrelado ao conteúdo da revista. Acredito, pelo que aconteceu em seguida, que esse foi um momento crucial na produção de jogos nacionais e que se tivesse sido explorado com mais coragem, estaríamos todos nós em um patamar bem diferente hoje, principalmente em termos de participação no mercado consumidor.

Mas a editora pagava (e bem) pelo direito de publicação, então eu topei.

A partir do imenso sucesso editorial gerado pela publicação (inédita até então) de um jogo totalmente em Assembler e um adventure com a complexidade do Aventuras na Selva começaram a aparecer pequenas empresas com propostas de produção original, ao lado das cópias e adaptações que estavam modelando o mercado. Foi um grande incentivo para que mais autores se aventurassem a criar seus jogos.

Nenhum produto faz sucesso no mercado sozinho.

De certa forma foi uma grande lição: quando há um movimento positivo de troca de experiências, conversas, amizade, etc, a criação flui naturalmente, mas para isso acontecer é preciso existir um mecanismo eficiente para aglutinar e divulgar os trabalhos e isso era feito na época pela revista Micro Sistemas.

Todos, autores e produtores, gravitavam ao redor da revista que não apenas podia divulgar as produções como servir de plataforma de publicidade para vendas (o que aliás aconteceu e fortaleceu o mercado produtor por quase 10 anos).

Essa agitação toda produzida na primeira metade dos anos 80 colocou a todos diante da primeira e mais importante questão de cunho comercial e que ainda hoje é pertinente: qual plataforma ou linha de computador adotar como foco central da produção?

Cada modelo, cada linha, cada processador configura um tipo de equipamento e portanto de mercado consumidor. Não basta avaliar apenas o potencial deste ou daquele equipamento e muito menos decidir apenas pelo gosto ou conhecimento do autor/equipe, mas considerar fundamentalmente o público usuário do hardware escolhido. Naquela época e para jogos, destacavam-se os Sinclair ZX, os Apples II, os TRS color e mais distante um pouco os TRS 80. PC nem pensar. Não era um segmento de mercado viável para jogos.

No entanto, já apontavam no horizonte nacional duas novas linhas de equipamento criadas especificamente para o entretenimento e uso pessoal: os ZX Spectrum e os MSX.


Cobertura na mídia do jogo Amazônia

Do ponto de vista da produção, estávamos em 84/85 no topo do consumo das primeiras linhas e na expectativa de grandes mudanças em termos não apenas do perfil de consumo, mas na força e apelo comercial dos novos micros. Foi levando tudo isso em consideração que o Amazônia chegou ao mercado, desenvolvido como um remake ampliado do Aventuras na Selva para os principais micros pré existentes e para os novos lançamentos de hardware.

O mercado fervilhava de ideias, conceitos, propostas de novos jogos, propostas comerciais, etc. Foi talvez o melhor momento para um autor de jogo, pois esse era um profissional disputado pelas softhouses mais atuantes da época. Cada autor levava consigo uma ideia ou jogo original já pronto e isso começava a valer ouro.

As vendas cresceram rapidamente. As principais lojas e magazines do país vendiam não apenas os computadores, mas os programas e em especial os jogos. Os investimentos em marketing, distribuição e publicidade começaram a aumentar em números.

E então, no momento mais brilhante do mercado produtor de jogos, o mundo acabou e levou junto tudo e todos. O tempo parou, congelado por um programa econômico de nome estranho: Plano Cruzado.

Todo mundo “quebrou”. Literalmente.