Fazer é instrutivo e divertido

Publicado originalmente na TILT online, no início dos anos 2000.

Não se pode negar que os jogos de computador exercem um tremendo fascínio sobre os jovens e sobre os não tão jovens também. O desafio de conquistar mundos, povos, desvendar mistérios intrincados, salvar nosso planeta das hordas bárbaras de alienígenas monstruosos ou simplesmente passar horas tentando solucionar um arranjo racional de cartas de baralho é irresistível para qualquer ser humano dotado de atividade cerebral (ainda que mínima).

Porém jogar não é apenas divertido. É também instrutivo e de uma forma (além das óbvias) que raramente nos damos conta: o aprendizado do fazer. Explico melhor...

No início da década de 80 aparecem no mercado brasileiro os primeiros computadores pessoais. Tornaram a partir daí produtos de consumo doméstico e passíveis de serem adquiridos numa visita a um grande magazine, loja de som ou mesmo em lojas de departamento. Lojas especializadas, nem pensar.

O hardware antecede em muito tempo o surgimento do software comercial. Você podia comprar um entre vários modelos de computador, mas não existia um único programa para ser adquirido. Nem mesmo como forma alternativa ou pirata. O amigo camarada que grava zilhões de jogos em CDs? Nem tinha nascido ainda.

Neste contexto, a única saída plausível para o usuário era fazer ele mesmo os seus programas e para isso tornava-se imprescindível uma leitura atenta do manual do equipamento que, na esmagadora maioria dos casos, não passava de um tutorial sobre programação. Justifica-se portanto o estrondoso sucesso que as publicações especializadas em informática tiveram nesta época e em especial as revistas de computador.

Munidos de um instrumental mínimo e com muita disposição, os usuários tornam-se ao longo de algumas seções de experimentos, sucessos e fracassos, "programadores". E é claro, uma das modalidades de "programa" que se pensa fazer, no exato instante em que sentimos ter algum domínio da técnica, é nada mais nada menos do que um jogo.

Na verdade, a programação de jogos é uma grande mola propulsora que nos leva a evoluir no conhecimento das técnicas, truques e macetes de programação. Quase todos "programadores" guardam dentro do seu íntimo aquela vontade irresistível de fazer um jogo. Por mais simples que ele seja.

Nos primeiros anos do computador pessoal já era divertido jogar. Mas era mais divertido ainda fazer os jogos. O entretenimento não era apenas o jogo mas fazer o jogo. Buscar o conhecimento necessário e resolver as questões técnicas de forma a obter o resultado pretendido.

A finalidade quase sempre era trocar jogos entre usuários, publicar em revistas, distribuir fitas no colégio para os amigos, etc. O prazer de fazer era tão ou mais intenso que o prazer de descobrir e adquirir o conhecimento. Reconhecer-se capaz de criar algo é uma das poucas sensações humanas que não pode ser descrita em palavras.

Com a evolução das máquinas, das técnicas, dos recursos e dos jogos, chegamos aos dias atuais a um resultado onde coisas impensadas há 10 anos atrás, não passam de um mero detalhe. Cores, sons, imagens e mais uma infinita gama de recursos técnicos à nossa disposição nos cativam de forma quase que hipnótica. A complexidade das estruturas funcionais e da programação já não nos permite desvendar os segredos e mistérios da criação, num único fim de semana. Será mesmo?

A criação do jogo comercial, aquele que deslumbra nossa imaginação antes mesmo de ser tirado da caixa ou baixado pela internet, realmente está longe do alcance dos mortais comuns (usuários de um modo geral). Hoje apenas profissionais formados e com dedicação integral, reunidos em empresas de desenvolvimento e produção de jogos, podem dar conta deste tipo de demanda.

Mas aquele jogo simples, aquele que nos dá prazer de ser feito, justamente porque nos divertimos fazendo-o, ou simplesmente provando o gosto da criação, este ainda está a uma distância não apenas possível, mas facilmente alcançável.

O convite que faço a você leitor é no sentido de aprender, descobrir formas e técnicas e desvendar os mistérios intrincados por trás de um jogo. Do seu funcionamento e da sua aparência. Divertir-se fazendo e aprendendo, porque conhecimento nunca é demais.